Descubra por que e como o acordo de sócios pode salvar a sua empresa
1. Introdução: a importância da boa relação entre os sócios
Os relacionamentos são importantes em todas as áreas da vida. Quase ninguém trabalha sozinho e, muitas vezes, várias cabeças pensando ao mesmo tempo chegam a soluções melhores de forma mais rápida. A cooperação tem poder.
Quando falamos de empresas, então, isso é mais comum ainda. Embora existam exemplos de empreendedores que tenham atingido o sucesso sem sócios, vemos que a maioria encontrou uma parceria de confiança capaz de gerar frutos por longo tempo.
Isso acontece , principalmente, pelo fato de que uma única pessoa não consegue reunir todas características suficientes para fazer uma empresa funcionar e crescer. Nesse cenário, a busca por sócios que se complementam é fundamental.
É uma pena que nem tudo sejam flores. As relações entre os sócios são capazes de gerar conflito ou mesmo, quando mal administradas, causar a paralisação da sociedade. Em casos mais extremos, pode levar até a dissolução da sociedade.
Além disso, conforme a sociedade cresce, a entrada de novos sócios traz novos interesses, que nem sempre coincidem com os pré-existentes. Na verdade, o normal é que eles conflitem, dado que os fundadores se diluem à medida que novos investidores entram.
Harmonizar interesses nem sempre coincidentes não é tarefa fácil. Entretanto, com diálogo, a tarefa se torna possível. Indo além, você pode dar forma a essas conversas e transformá-las em um acordo de sócios.
2. O que é o acordo de sócios?
Simplificando, trata-se de um contrato que vai regular as relações entre os sócios dentro da sociedade. Ou seja, não é um documento que deva ficar acessível para todas as pessoas. Ele serve para alinhar os pontos mais importantes em matérias como voto, compra e venda de ações, resolução de conflitos dentro da sociedade, etc.
Talvez você nunca tenha ouvido falar dele, mas saiba que os investidores fazem questão de que as empresas investidas façam um acordo de sócios. É uma medida que confere segurança e previsibilidade às relações sociais. Não há espaço para surpresas nesse caso. Procura-se prever o máximo possível para não depender da sorte.
3. Para quem é o acordo de sócios?
Há uma noção equivocada de que só grandes sociedades anônimas precisam de acordo de sócios, pois apenas essas companhias teriam relações complexas o suficiente para justificar o acordo de acionistas.
Entretanto, isso não é verdade. As sociedades limitadas, mesmo pequenas, desde que tenham mais de um sócio, devem ter um acordo de quotistas que regule as relações entre os empreendedores. Problemas vão existir em empresas de qualquer porte. Quanto mais cedo você se preocupar em resolvê-los, mais rápido você chegará ao seu objetivo.
Ainda, a LTDA, sobretudo em razão da sua plasticidade, exige que o acordo de quotistas fixe algumas regras do dia a dia, a fim de facilitar a dinâmica das atividades dos sócios. É uma potente barreira contra a desconfiança.
O acordo de sócios é para todos os empreendimentos que querem evitar que o caos se instale ao menor sinal de briga. A paz é fundamental para que qualquer empresa prospere, e o acordo de sócios constitui o primeiro passo em direção à harmonia entre os sócios de uma empresa.
Agora, eu vou te mostrar quais são os pilares fundamentais de um acordo de sócios.
4. O que não pode faltar no seu acordo de sócios?
Diferentemente do contrato social, que possui cláusulas obrigatórias, o acordo de sócios não precisa conter alguma cláusula necessariamente. Ocorre que há disposições que costumam aparecer em vários acordos de quotistas ou de acionistas na prática. É sobre essas cláusulas que vamos tratar a seguir.
4.1 Regulação do direito de voto no acordo de sócios
4.1.1 Alinhamento do voto em determinadas matérias
O voto, sem sombra de dúvidas, ocupa lugar de destaque em qualquer acordo de sócios. As razões para tanto são fáceis de explicar. As deliberações afetam os rumos da empresa e podem determinar o seu sucesso ou fracasso. Por isso, é importante que haja coordenação entre os empreendedores.
Pode acontecer, ainda, que o controle não pertença a um sócio específico. Formam-se os chamados blocos de controle, cuja regulação requer um contrato específico que discipline comportamentos e imponha penalidades. Esse será o papel do acordo de sócios.
Nesse sentido, pode-se determinar a realização de encontro prévio à reunião ou assembleia de todos os sócios para alinhar os votos de acordo com a pauta prevista na ordem do dia. O que for decidido nesse encontro prévio vinculará aqueles que assinaram o acordo de sócios, sendo inclusive nulos os votos dados em sentido contrário.
4.1.2 Direito de veto e voto afirmativo
É um mecanismo bastante utilizado pelos sócios minoritários para barrar matérias que lhe sejam prejudiciais. Pode ser útil no caso de fundadores que desejam vender parte da sua empresa a investidores ou mesmo realizar uma oferta pública de ações.
Mediante o estabelecimento do direito de veto, algumas matérias só serão aprovadas se o sócio específico não se opuser. No caso do voto afirmativo, o item da pauta somente será aprovado se contar com o voto daquele acionista ou quotista.
Se você é minoritário, vale a pena inserir essa cláusula no seu acordo de sócios. Desse modo, você se protege contra estratégias abusivas do majoritário. Já se você está pelo lado do sócio controlador, fique de olho nos termos em que essa cláusula será inserida para evitar que matérias importantes fiquem nas mãos apenas de poucos sócios.
4.2 Critérios para a eleição e atuação dos administradores no acordo de sócios
4.2.1 Eleição dos administradores
Nomear os administradores em ato separado, e não no contrato social, é uma medida simples que facilita a retirada dos gestores que não realizem o seu trabalho da maneira certa. O acordo de sócios permite que a eleição dos administradores se guie por critérios comuns às partes, evitando conflitos na gestão da sociedade.
Tratando das sociedades anônimas, em que há conselho de administração, é importante que os critérios para a eleição dos conselheiros estejam bem fixados, para garantir a uniformidade na tomada de decisões, no caso dos controladores. No caso dos minoritários, convém alinhar quais parâmetros a serem adotados na eleição dos cargos no conselho em caso de adoção do voto múltiplo.
4.2.2 Atuação dos administradores
A atuação dos administradores também poderá figurar no acordo de sócios. Entretanto, cabe advertir que o gestor também deve guardar os deveres de diligência, informação e lealdade, sob pena de ser responsabilizado pela companhia. As diretrizes do acordo de sócios, portanto, não podem lesar os acionistas ou quotistas que não são parte do acordo.
Nesse ponto, é necessário analisar as circunstâncias concretas da empresa para saber quando haverá esse conflito de interesses. Além disso, é possível delimitar quais atos os gestores poderão praticar sem ter de consultar os sócios e quais dependem da aprovação dos empreendedores.
4.3 Questões de compra a venda de participação societária no acordo de sócios
A regulação do direito de preferência não pode faltar no acordo de sócios. Determine as formas e prazos sob os quais se dará o exercício dessa prerrogativa, inclusive a possível renúncia à preferência em caso de um mútuo conversível, por exemplo. Dessa forma, você consegue evitar questionamentos judiciais quando houver a necessidade de venda das quotas ou ações.
Outro ponto fundamental para constar no seu acordo de quotistas ou de acionistas são as cláusulas de tag along e do drag along.
O primeiro refere-se à venda conjunta caso o majoritário deseje vender as suas ações ou quotas em bloco. O minoritário, visando proteger-se, pode exigir que a sua participação seja adquirida conjuntamente, sob as mesmas condições.
O segundo ocorre quando um minoritário se recusa a ceder a sua participação. A cláusula de drag along permite que o majoritário “obrigue” o minoritário a vender sua participação nas mesmas condições que lhe foram oferecidas.
Assim, resumidamente, a cláusula de tag along visa proteger o minoritário, que poderá aproveitar uma oferta feita e vender também sua participação, enquanto a cláusula de drag along visa proteger o majoritário, que poderá impedir que o minoritário barre uma venda da empresa em caso de uma oferta integral.
Detalhar o exercício desses dois direitos dará segurança a ambos os lados sobre quando e como poderão exercer os seus direitos.
Por fim, a cláusula de lock up garante estabilidade ao quadro societário ao proibir a saída dos sócios por um determinado período. Nas fases iniciais de uma startup, por exemplo, é fundamental que os fundadores estratégicos permaneçam na empresa.
4.4 Não concorrência no acordo de sócios
As proibições de competição exigem cuidado para que não sejam consideradas abusivas. Seja específico quanto à atividade proibida e à abrangência da vedação. Dessa forma, você corre menos risco de ver o seu acordo invadido pelo Poder Judiciário.
4.5 Confidencialidade no acordo de sócios
Por ser um documento de caráter privado, é comum que o acordo de sócios contenha cláusula de confidencialidade. O fator surpresa tem grande peso nas disputas de poder dentro da sociedade. Por isso, convém que as estratégias não sejam divulgadas, sob pena de perderem o efeito desejado.
Assim, o acordo de sócios pode impor uma multa para violação da cláusula de confidencialidade e deixar detalhado qual tipo de informação deve ser mantida em sigilo pelos sócios.
4.6 Resolução de conflitos no acordo de sócios
Não importa o quanto de cuidado você tenha ao redigir um acordo de sócios, o conflito acabará se manifestando. Quando chegar o momento, você vai necessitar de mecanismos capazes de criar incentivos ao diálogo.
É importante prever mecanismos de resolução de disputas, como:
O uso da mediação ou negociação – dessa forma, as partes poderão conversar de maneira cooperativa antes de tomar medidas drásticas;
As opções de compra (call option) e de venda (put option) – que garantirá a saída rápida de um sócio que não esteja cumprindo com os seus deveres na sociedade.
a cláusula buy or sell (uma parte faz a oferta, e a outra escolhe se compra ou vende) — com a qual será possível a obtenção de um critério o mais justo possível para ambas as partes;
A cláusula compromissória – quando o conflito será submetido ao árbitro, profissional experiente e especializado, embora caro.
Essas três medidas podem vir isoladamente ou combinadas. Tudo dependerá do contexto em que foram inseridas. O mais importante é que elas facilitem a resolução dos impasses.
5. Conclusão
Ter um acordo de sócios não deve ser um luxo de poucas empresas. Todas as sociedades, das menores às gigantescas, deparam-se com decisões importantes, diante das quais é necessário agir com coordenação. A garantia de que os sócios terão critérios sólidos para chegar ao melhor resultado confere legitimidade às deliberações.
Sem contar que ter um acordo de quotistas ou de acionistas mostra para o investidor que você já fez a lição de casa. Quem investe dinheiro em uma empresa quer ver organização, coordenação e dinamismo. O acordo de sócios cumpre com os três requisitos.
E você? Já fez o seu acordo de sócios?
Originalmente publicado em: Jusbrasil